sábado, 23 de abril de 2022

Visitação

Encontramos-nos ali: no frenesi de gente cheirando a álcool e outras drogas. 

O suor da chegada escorregando lento pelo pescoço da Madame - que exercia um papel destacado sob a luz de um cordão dourado afugentado de ouro, embora parecesse bijuteria barata daquelas bem chinfrim - entregava uma face diferente daquela mulher vasta em labirintos. 

De tanta surpresa os olhares sorriam e reconhecendo ali, na euforia de tudo, um breve apaziguar de maledicências - sim, há tormenta maior que o amor? - senti meu coração pulsar igual as ondas quando arrebentam e desejei que meus lábios fossem como a leveza da espuma delicada no areal banhando os pequeninos seres que vivem ali, passageiros em suas ideias sobre existência. 

Não me demorei no lugar por muito tempo. 
Fui embora sem despedidas ou vontade de voltar para os escombros que desenham memórias em nossas curvas. 
Sai sem travar saudade no peito.



 

terça-feira, 12 de abril de 2022

Estou nublada e não sei chover

   Devoro as palavras com voracidade para que o sobejo não prevaleça vivo sobre a minha pele - distante e confusa - assim considero que trazer a tona o significado, a epistemologia do que sinto: rasgando, engasgando, sobressaltando da minha garganta, não ouse como faca cega a ferir sem pudor. 
   Ainda que as cores tenham ganhado um brilho sublime e preenchendo todas as camadas antes sépia, com uma saturação de tons quentes, exigir a coerência das palavras em relação a tudo que acontece agora com riqueza de detalhes é parecido com o exame de retina:
A luz 
Dilata
O olho 
Máquinas 
Sons
Ruídos 
Visão embaçada 
Passos errantes
Tempo
   E de repente tudo volta ao normal. Nada mudou de verdade. Retornamos ao que de fato somos em nossas concepções. Peças remontadas de uma antiga construção de crateras e pequenas ruínas, lugares inabitáveis. 
   Um amargo no final da língua e a lembrança ainda latente da imagem assustadoramente linda de uma mulher que amei a ponto de não saber mais onde tocar e em que parte do sonho, tudo se tornou ilusão, desmoronando sobre meus pés e meus ouvidos ensurdeceram de tanto escutar as lamúrias do que se foi como folha seca jogada na lama em dias de chuva. 

quarta-feira, 6 de abril de 2022

Deleita-te

A pele ainda arredia, doce. 
Substâncias líquidas penduradas em meus cabelos. 
Cheiro transeunte e toques refrescantes. 

Mil caos caíram ao meu lado e eu fui atingida! 

O corpo sonolento numa noite nublada. 
Afago e mordidas. Seio ouriçado!
Percorre o quarto um som complexo dos corpos
em movimento. 

Dentro e forte pulsa como uma grande nuvem 
carregada preste a jogar sobre o solo, toda água 
que fertiliza as semente e faz germinar o bruto 
fruto da paixão. 

Me toca meridiana, de ponta a ponta!
Suga com afeto as extremidades e os orifícios deságuam. 

Mata essa sede como quem vive no deserto e não te apressas em ir embora, deita 
as tuas mãos mornas no meu ventre e dorme.

Quando durmo

Aprendendo a gostar do efêmero  tanto quanto não me saciar no tempo  das coisas findas rapidamente.  E então me deparo, as vezes tarde demai...